terça-feira, 28 de julho de 2015
segunda-feira, 20 de julho de 2015
Eliane Brum: Por quem rosna o Brasil | Opinião | EL PAÍS Brasil
Eliane Brum: Por quem rosna o Brasil | Opinião | EL PAÍS Brasil: "de corrupção sempre que têm oportunidade. A ideia de que o Congresso democraticamente eleito, formado por um número considerável de oportunistas e corruptos, não corresponde ao conjunto da população brasileira é talvez a maior de todas as ilusões. É duro admitir, mas Eduardo Cunha é nosso.
Neste Brasil, a presidente Dilma Rousseff (PT), acuada por ameaças de impeachment mesmo quando (ainda) não há elementos para isso, é um personagem trágico. Vendida por Lula e pelos marqueteiros na primeira eleição, a de 2010, como “mãe dos pobres”, ela nunca foi capaz de vestir com desenvoltura esse figurino populista, até por sinceridade. Quando tenta invocar simbologias em seus discursos, torna-se motivo de piada. O slogan de seu segundo mandato – “Brasil, Pátria Educadora” – não encontra nenhum lastro na realidade, virando mais uma denúncia do colapso da educação pública do que o movimento para recuperá-la. Parece que os marqueteiros tampouco entendem o Brasil deste momento e seguem acreditando que basta criar imagens para que elas se tornem imaginários. O próprio Lula parece ter perdido sua famosa intuição sobre o Brasil e sobre os brasileiros. Em suas manifestações, Lula soa perdido, intérprete confuso de um Brasil que já não existe.
Os protagonistas das manifestações de 2015 gritam também para manter seus privilégios
Agora que já não contamos com os velhos clichês e imaginários, a crueza de nossa imagem no espelho nos assusta. Diante dela e de uma presidente com a autoridade corroída, cresce a sedução dos autoritarismos. Nada mais fácil do que culpar o outro quando não gostamos do que vemos em nós. Em vez de encarar o próprio rosto, cobre-se a imagem perturbadora com alvos a serem destruídos. Aqueles que encontram nesta adesão aos discursos autoritários uma possibilidade de ascensão, esquecem-se da lição mais básica, a de que não há controle quando se aposta no pior. Só há chance se enfrentarmos conflitos e contradições com a cara que temos. É com esses Brasis que precisamos nos haver. É essa imagem múltipla que temos de encarar no espelho se quisermos construir uma outra, menos brutal.
O que o governo Lula adiou, ao escolher a conciliação em vez da ruptura com os setores conservadores, está na mesa. Há várias forças se movendo para encontrar uma nova acomodação, que evite o enfrentamento das contradições e das desigualdades. É pelas bandeiras da reacomodação que as ruas foram ocupadas em 2015 pelo que alguns têm chamado de “nova direita”. Esta, se adere à novidade da organização pelas redes sociais e aparentemente se coloca fora dos esquemas tradicionais da política e dos partidos, talvez seja menos “nova” do que possa parecer nas questões de fundo.
A próxima manifestação, marcada para 16 de agosto, é acompanhada com atenção pelos políticos e partidos tradicionais que conspiram pelo impeachment da presidente eleita. Os manifestantes de 2015 gritam contra a corrupção, mas basta escutá-los com atenção para compreender que gritam para deixar tudo como está. E, se possível, voltar inclusive atrás, já que uma parte significativa parece ter se sentido lesada por políticas como a das cotas raciais e outros tímidos avanços na direção da reparação e da equidade. A redução da maioridade penal, assim como outros projetos conservadores em curso, são também exemplos de uma resposta autoritária – e inócua – para o esgarçamento crescente das relações sociais e para a violência.
Há muito barulho sendo produzido hoje, como o próprio discurso de Eduardo Cunha em cadeia nacional (17/7), para desviar o foco do grande nó a ser desatado: não haverá justiça social e igualdade no Brasil sem tocar nos privilégios. Muita gente bacana ainda segue acreditando no conto de fadas de que é possível alcançar a paz sem perder nada. Não é. Quem quiser de fato reduzir a violência e a corrupção que atravessa o Brasil e os brasileiros, vai ter de pensar sobre o quanto está disposto a perder para estar com o outro. É este o ponto de interrogação no espelho. É por isso que o som ameaçador dos dentes sendo afiados cresce. E cresce também onde menos se espera.
Eliane Brum é escritora, repórter e documentarista. Autora dos livros de não ficção Coluna Prestes - o Avesso da Lenda, A Vida Que Ninguém vê, O Olho da Rua, A Menina Quebrada, Meus Desacontecimentos, e do romance Uma Duas. Site: desacontecimentos.com Email: elianebrum.coluna@gmail.com Twitter:"
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Neste Brasil, a presidente Dilma Rousseff (PT), acuada por ameaças de impeachment mesmo quando (ainda) não há elementos para isso, é um personagem trágico. Vendida por Lula e pelos marqueteiros na primeira eleição, a de 2010, como “mãe dos pobres”, ela nunca foi capaz de vestir com desenvoltura esse figurino populista, até por sinceridade. Quando tenta invocar simbologias em seus discursos, torna-se motivo de piada. O slogan de seu segundo mandato – “Brasil, Pátria Educadora” – não encontra nenhum lastro na realidade, virando mais uma denúncia do colapso da educação pública do que o movimento para recuperá-la. Parece que os marqueteiros tampouco entendem o Brasil deste momento e seguem acreditando que basta criar imagens para que elas se tornem imaginários. O próprio Lula parece ter perdido sua famosa intuição sobre o Brasil e sobre os brasileiros. Em suas manifestações, Lula soa perdido, intérprete confuso de um Brasil que já não existe.
Os protagonistas das manifestações de 2015 gritam também para manter seus privilégios
Agora que já não contamos com os velhos clichês e imaginários, a crueza de nossa imagem no espelho nos assusta. Diante dela e de uma presidente com a autoridade corroída, cresce a sedução dos autoritarismos. Nada mais fácil do que culpar o outro quando não gostamos do que vemos em nós. Em vez de encarar o próprio rosto, cobre-se a imagem perturbadora com alvos a serem destruídos. Aqueles que encontram nesta adesão aos discursos autoritários uma possibilidade de ascensão, esquecem-se da lição mais básica, a de que não há controle quando se aposta no pior. Só há chance se enfrentarmos conflitos e contradições com a cara que temos. É com esses Brasis que precisamos nos haver. É essa imagem múltipla que temos de encarar no espelho se quisermos construir uma outra, menos brutal.
O que o governo Lula adiou, ao escolher a conciliação em vez da ruptura com os setores conservadores, está na mesa. Há várias forças se movendo para encontrar uma nova acomodação, que evite o enfrentamento das contradições e das desigualdades. É pelas bandeiras da reacomodação que as ruas foram ocupadas em 2015 pelo que alguns têm chamado de “nova direita”. Esta, se adere à novidade da organização pelas redes sociais e aparentemente se coloca fora dos esquemas tradicionais da política e dos partidos, talvez seja menos “nova” do que possa parecer nas questões de fundo.
A próxima manifestação, marcada para 16 de agosto, é acompanhada com atenção pelos políticos e partidos tradicionais que conspiram pelo impeachment da presidente eleita. Os manifestantes de 2015 gritam contra a corrupção, mas basta escutá-los com atenção para compreender que gritam para deixar tudo como está. E, se possível, voltar inclusive atrás, já que uma parte significativa parece ter se sentido lesada por políticas como a das cotas raciais e outros tímidos avanços na direção da reparação e da equidade. A redução da maioridade penal, assim como outros projetos conservadores em curso, são também exemplos de uma resposta autoritária – e inócua – para o esgarçamento crescente das relações sociais e para a violência.
Há muito barulho sendo produzido hoje, como o próprio discurso de Eduardo Cunha em cadeia nacional (17/7), para desviar o foco do grande nó a ser desatado: não haverá justiça social e igualdade no Brasil sem tocar nos privilégios. Muita gente bacana ainda segue acreditando no conto de fadas de que é possível alcançar a paz sem perder nada. Não é. Quem quiser de fato reduzir a violência e a corrupção que atravessa o Brasil e os brasileiros, vai ter de pensar sobre o quanto está disposto a perder para estar com o outro. É este o ponto de interrogação no espelho. É por isso que o som ameaçador dos dentes sendo afiados cresce. E cresce também onde menos se espera.
Eliane Brum é escritora, repórter e documentarista. Autora dos livros de não ficção Coluna Prestes - o Avesso da Lenda, A Vida Que Ninguém vê, O Olho da Rua, A Menina Quebrada, Meus Desacontecimentos, e do romance Uma Duas. Site: desacontecimentos.com Email: elianebrum.coluna@gmail.com Twitter:"
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